sábado, 25 de setembro de 2010

Sofrimento e Mudança

Freud (1930, O Mal-estar na civilização) diz que todos nós enquanto humanos estamos sujeitos a três tipos de sofrimento:

- o que advém do nosso corpo, condenado à doença e à degradação;

- o que advém com as consequências de desastres naturais;

- o sofrimento que advém com os relacionamentos humanos.

Tenho pensando acerca do sofrimento que advém com o aparecimento de situações que nos fazem estar de cara com nossa vulnerabilidade e finitude, como uma doença que muda toda a vida de uma pessoa. O adoecimento pode acarretar profundas mudanças nela: afastá-la do trabalho, da família, fazê-la se questionar sobre a vida.

É curioso o fato das pessoas não se prepararem para as situações de vulnerabilidade na vida. E será que há formas de preparo? Acho que sim, não enquanto controle absoluto das coisas imprevísiveis que possam ocorrer, mas uma consciência maior de nossas limitações e fragilidade de ser humano. Aceitar nossa condição de finito, investir em nós mesmos e no ambiente ao nosso redor, ou seja, realizar atividades que contribuam para uma melhor qualidade de vida.

Percebo também o quanto é difícil atravessar certas fases da vida. Sair da vida de universidade e entrar no mercado de trabalho... como ser jogado numa jaula de leões e estar sem ninguém para te proteger. Ver os filhos crescidos, conviver com filhos adultos, que fazem suas próprias escolhas e não tem mais tanta necessidade da proteção familiar. Adoecer e se deparar com o envelhecimento do corpo, a falta da energia de antes, a possibilidade de ter que se afastar do trabalho, de não poder fazer as mesmas coisas que antes. Perdas de pessoas queridas que trazem consigo enorme sofrimento também.

Situações que fazem com que nos deparemos com nossa vulnerabilidade, nosso limite, nossa condições de seres finitos, mortais, portadores de um corpo submetido à ação do tempo e passageiro na vida.

E o que fazer diante disso tudo que nos afeta tanto? Que mexe com o que somos na base de nossa existência: nossa vida? Cada um terá que dar sua resposta. Mas podemos pensar em formas que podem nos propiciar bem-estar como compartilhar nosso sofrimento com outras pessoas, explorar as diferentes possibilidades de ser e estar no mundo, buscar atividades que nos façam felizes e que contribuam para a humanidade. E jamais deixar de lutar, não se entregar, manter a firmeza diante dos percalços que fazem parte da existência humana.

Para acrescentar à nossa reflexão, o pensamento de um filosófo:

"Do meu ponto de vista, não existe miséria para um homem a não ser a de achar que algo que faz parte da natureza das coisas não está correto. (...)

Sempre que a vida me parece cruel e adversa, imponho a seguinte regra: não obedecer aos deuses, mas segui-los. Faço isso por que quero, não por obrigação. Nada do que vier a me acontecer me abaterá e me deixará com a aparência alterada. Aceitarei de boa vontade aquilo que me cabe, pois tudo o que provoca nossos sofrimentos é a lei da vida. (...)

Tua bexiga te incomoda? Chegaram más notícias pelo correio? Há perdas incessantes? Indo mais longe, temes por tua vida? Pensa bem, não sabias que desejavas tudo isso ao querer envelhecer? Tudo isso faz parte de uma longa vida, como a poeira, a lama e a chuva durante uma viagem.

(...) Viver Lucílio, é ser soldado. É por isso que aqueles que se arriscam em missões mais perigosas, através de penhascos e desfiladeiros, são os mais valentes, a elite da tropa. Já aqueles que se ocupam apenas com leves tarefas, enquanto os outros dão o máximo de si, esses não passam de mocinhos delicados, no abrigo, mas sem honras
."

Lucio Anneo Sêneca (ca.4 a.C-ca.65 d.C), no livro Aprendendo a Viver

A Importância dos Vínculos

Cada vez mais me convenço da importância dos vínculos em nossa vida. Vínculo não é com qualquer pessoa, não se dá com todas as pessoas, mas com aquela determinada pessoa. Cada vínculo é uno, diferente um do outro, cada pessoa vai despertar emoções, assuntos e confissões diferentes. Às vezes, quando voltamos de encontros profundos com essas pessoas até ficamos mais recolhidas em ambientes em que não sentimos esse acolhimento todo, pois sabemos que aquela preciosidade não se dá em qualquer contato. Contato não é encontro. Podemos conviver com várias pessoas, mas apenas algumas vão acender aquela chama de troca que alimenta nossa alma e nosso coração, que nos faz sentir vivos e atuantes no mundo.

Como é bom receber pessoas em nossa casa, em nossa vida, em nosso coração. Também é tão bom visitar pessoas, passar horas conversando, ver como cada pessoa está lidando com mudanças que também vivenciamos e com mudanças que virão pela frente.

Escutar as diferenças e semelhanças quanto à decisão por essa grande mudança que segue seu curso. Perceber angústias, medos, dificuldades, alegrias parecidas. Acalenta-nos saber que é difícil para outras pessoas também, que aquilo que desejamos vir a ser realizado traz todo um pacote de temores, expectativas, assim como seus enfeites, cores e tonalidades vibrantes. Isso é a vida: um misto de dor e entusiasmo, de esperança e medo, de deslumbramento e hesitação.

Para além dos vínculos famliares (parentes, conjugê, etc.), necessitamos desses outros olhares, sorrisos, sonhos, histórias de luta pela vida. É claro que nossa família é fundamental, ter raízes para poder se re-alimentar, e também asas para poder formar uma nova família, num novo período de nossa vida de maturidade, de crítica, de questionamenstos acerca da vida a dois e da vida familiar que queremos escrever no livro da nossa vida, seguindo nossas escolhas, acertando, errando, tentando corrigir erros e vivenciar cada vez mais a harmonia. Voltar a escolher esse amor a cada dia e as mudanças que isso acarretou às nossas vidas, e é muito bom você tomar sua própria decisão e viver dela, como disse uma amiga. Assim como precisamos da riqueza cheia de diversidade que outras pessoas podem nos trazer, nos enriquecer de outras ideias e outras visões de mundo, ampliar nosso olhar, olhar para fora para poder enxergar melhor o que há dentro de nós.

É importante nos re-abastecer de energia nesses momentos em que estamos com pessoas próximas, energia que muitas vezes se esvai nas dificuldades, no cansaço, na luta do dia a dia, na falta de um momento em que possamos olhar para dentro de nós, ao estarmos diante do outro. Que saibamos dar e receber aos nossos vínculos apesar da correria do dia a dia.

Podes crer
(Da Gama / Bino Farias / Lazão / Toni Garrido)

o que é, meu irmão
eu sei o que te agrada
e o que te dói, e o que te dói
é preciso estar tranqüilo
pra se olhar dentro do espelho
refletir
o que é?
seja você quem for
eu te conheço muito bem
e isso faz bem pra mim
isso faz bem pra vida
onde quer que vá
eu vou estar também
eu vou me lembrar
daquela canção que diz

parapapapa....

bendito
encontro
na vida
amigo

é tão forte quanto o vento quando sopra
tronco forte que não quebra, não entorta
podes crer, podes crer,
eu tô falando de amizade

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Reencontros



Após tanto tempo ser presenciar a reunião de tantos familiares (pais, irmãos, tios, primos, avó, etc.), eu já imaginava essa possibilidade ali e esperava feliz por esse dia, além de ser uma importante ocasião especialmente para um querida prima que tem quase a minha idade.

E, de fato, todos vieram, inclusive os mais novos membros da família (até um que ainda nem nasceu...).

E como foi bom revê-los ali, juntos. Ver os novos bebês da família, ouvir os cumprimentos pela nova vida que está sendo gestada em mim.

É bebê, essa também será sua família. E você já foi sonhado não só por nós, casal de pais, mas também por eles, nossos familiares.

E a dona da festa já tinha profetizado que chegaria essa festa e este novo membro já estaria na barriga da mãe (e isso há quase um ano atrás).

Mesmo com tantas mudanças que a vida trouxe, essas pessoas continuam significativas em minha vida. Pessoas que me viram crescer e que verão crescer a vida que trago em mim.

Não nascemos do nada, não nos criamos nem nos formamos sozinhos, mas fazemos parte de toda uma história pregressa, história de pessoas que amaram, que gestaram e criaram seus filhos, que trabalharam com muito suor, que conquistaram, que sofreram, que riram, choraram, se alegraram, se entristeceram, que passaram por mudanças. Alguns se foram, outros continuam por aí, tendo outras mudanças e fazendo parte ou presenciando a mudança de outros entes queridos.

Fazemos parte de uma linhagem, todos nós possuímos uma história familiar e, a partir dela, podemos entender um pouco de nós mesmos, de nossas escolhas, entender um pouco das grandes aventuras às quais nos arriscamos no momento do agora.

sábado, 11 de setembro de 2010

Encontros


Suponho que me entender não é uma questão de inteligência e sim de sentir, de entrar em contato...
Ou toca, ou não toca.
(Clarice Lispector)

Há encontros que são preciosos, especiais. Que tocam o fundo de nosso ser. Que nos proporcionam momentos que valem por toda uma vida. Quando sentimos que há realmente uma troca, quando sentimos que o outro também está num processo de amadurecimento que acarretou profundas modificações em sua vida, em sua visão de mundo, e que nós conseguimos compartilhar um com o outro um pouco dessas tantas mudanças. Quando nos sentimos tão próximos de alguém que nos sentimos à vontade para contar aquela nossa dor mais íntima – e o amigo parece que entende nossa dor, e nos abraça, e nos consola, e parece estar dizendo com esses gestos: “Estou aqui, sei como é, também tenho minha dor, e também é difícil ter que encará-la algumas vezes...”

Como foi bom amiga, revê-la, receber sua visita em minha casa, mostrar um pouco da minha vida e saber da sua. Quem poderia pensar que uma amizade poderia aumentar tanto mesmo com tamanha distância física que nos separa? Distância física que não diminuiu a amizade, pelo contrário, aumentou a proximidade de nossas almas, em busca de entender esse mundo louco, de tentar ir na contramão dessa cultura que valoriza o imediatismo e o consumismo, de suportar perder nossa ingenuidade romântica sem perder o encanto pela vida, pelas mudanças, pelo encontro, por cada instante da vida que pode nos trazer tanto, nos trazer tamanha riqueza e doçura, apesar das tristezas e dores. Isso é a vida...

Encontros como esses são raros. E talvez por isso mesmo tão belos. Mais belos que a mais bem-feita cena de um filme maravilhoso. Esse tipo de encontro nos propicia refletir sobre a vida ao ver filmes, ler livros, ver vídeos, filosofar um pouco. Permite-nos dividir dores, contar histórias, dar de cara com semelhanças e diferenças, avaliar mudanças, rir de bobagens, nos abrir e fazer um balanço de que, apesar de tudo e das dores, a vida vale a pena (e quanto vale). Encontros acontecem não apenas quando vemos o outro de perto, podem vir por meio de cartas, e-mails, telefonemas.

Contudo, encontros também necessitam do cara a cara, do abraço, do beijo, do afago, afinal também somos seres e carentes, também temos um corpo que anseia sair dessa alienação e cada vez mais ser capaz de simplesmente sentir. Falar de dificuldades e conquistas, medos e superações, diante do olhar do outro. Falar da existência, com toda a dureza e poesia, que faz parte da vida.

Aos meus amigos, em especial à minha queria amiga que passou quase uma semana comigo. Carrego você comigo, carrego você no meu coração.

CARREGO VOCÊ COMIGO

Carrego você comigo

(carrego você no meu coração)

Eu nunca estou sem ele

(onde quer que eu vá você irá, minha querida (..)

(…)

Eis o maior segredo que ninguém conhece

(eis a raiz da raiz e o broto do broto

e o céu do céu de uma árvore chamada vida;

que cresce além do que a alma sonharia

ou a mente poderia esconder)

E este é o milagre que mantém a distância entre as estrelas

Carrego você comigo (eu carrego você no meu coração)



Autor: E.E. Commungs
(Declamado no filme: Em seu lugar – In yours shoes)

*Imagem: Flor de Lótus (Olhada com respeito e veneração pelos povos orientais, essa flor é freqüentemente associada a Buda, por representar a pureza emergindo imaculada de águas lodosas. Lótus é o símbolo da expansão espiritual, do sagrado, do puro.)