quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Tempo

Tempo, tempo, tempo, tempo.
“Para cada coisa, o seu tempo.”
“Tem coisas que só o tempo.”
“Tudo a seu tempo.”
“O tempo voa.”
Tempo que fere, tempo que cura.
Tempo que surpreende. Tempo que se repete.
Tempo que leva, tempo que traz.
Tempo que lembra a morte se aproximando,
Tempo que traz enxurrada de vida...
Tempo de paradoxos.
Tempo de mudanças.
Ainda há tempo? Ou já se foi o tempo?
Há coisas que foram com o tempo.
Há outras que insistem no tempo.
Há ainda aquelas que serão grandes surpresas do
Mestre tempo.
Tempo para se adaptar,
E tempo para se desadaptar...
Tempo para se apegar,
E tempo para se desapegar...
Tempo para dar boas-vindas.
E tempo para dar adeus...

Oração ao tempo
(Caetano Veloso)

És um senhor tão bonito
Quanto a cara do meu filho
Tempo tempo tempo tempo
Vou te fazer um pedido
Tempo tempo tempo tempo...
Compositor de destinos
Tambor de todos os rítmos
Tempo tempo tempo tempo
Entro num acordo contigo
Tempo tempo tempo tempo...
Por seres tão inventivo
E pareceres contínuo
Tempo tempo tempo tempo
És um dos deuses mais lindos
Tempo tempo tempo tempo...
Que sejas ainda mais vivo
No som do meu estribilho
Tempo tempo tempo tempo
Ouve bem o que te digo
Tempo tempo tempo tempo...
Peço-te o prazer legítimo
E o movimento preciso
Tempo tempo tempo tempo
Quando o tempo for propício
Tempo tempo tempo tempo...
De modo que o meu espírito
Ganhe um brilho definido
Tempo tempo tempo tempo
E eu espalhe benefícios
Tempo tempo tempo tempo...
O que usaremos prá isso
Fica guardado em sigilo
Tempo tempo tempo tempo
Apenas contigo e comigo
Tempo tempo tempo tempo...
E quando eu tiver saído
Para fora do teu círculo
Tempo tempo tempo tempo
Não serei nem terás sido
Tempo tempo tempo tempo...
Ainda assim acredito
Ser possível reunirmo-nos
Tempo tempo tempo tempo
Num outro nível de vínculo
Tempo tempo tempo tempo...
Portanto peço-te aquilo
E te ofereço elogios
Tempo tempo tempo tempo
Nas rimas do meu estilo
Tempo tempo tempo tempo...

sábado, 5 de outubro de 2013

Mudar e o tempo

Mudar de casa, mudar de cidade...
Uff, uff!
No começo, o caos... tudo desarrumado,
tudo fora do lugar... será q um dia isso irá acabar?
É preciso tolerar o tempo de espera.
Será que às vezes não sentimos esse caos dentro da gente tb?
Surge uma angústia inesperada...
Uma sensação de aperto no peito...
E a tempestade acalma.
É preciso acolher o tempo de espera.
Aceitar o tempo de espera.
Sem paralisar, sem deixar de refletir,
sem deixar de agir.
Abraçar o tempo de espera,
caminhar ora a passos lentos,
ora correndo mesmo,
nunca deixando de fazer sua escolha,
no seu tempo.

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Partida e persistência

"Partir, andar - eis que chega
essa velha hora tão sonhada...
(...)
Partir, andar - eis que chega
não há como deter a alvorada...."


O fim de uma etapa de 6 anos...
5 anos numa mesma cidade...
Duas semanas de tristeza saudosa nas despedidas.

Mudanças sonhadas também são temidas...
"Todo medo é um desejo"
Medo do novo, do recomeço, da mudança de fase.
Mudança necessária, mas momentos de partir sempre dão aquele nó na garganta,
nos recordam de que tudo tem um fim. Nossa existência também terá um fim um dia.

Enquanto há vida, vamos cultivando sonhos, realizando sonhos,
conhecendo pessoas que passam por nosso caminho e nos possibilitam
momentos interessantes, trocas compartilhadas, apoio na caminhada.

Consciência de que há momentos em que estaremos completamente sós,
sem ninguém a quem recorrer, às vezes nem alguém disposto a nos escutar.
Há momentos em que podemos contar só com a gente mesmo,
e gente persiste.
Persiste em lutar apesar do cansaço,
persiste em sonhar apesar da dureza,
persiste em mudar apesar do medo.
A vida, mesmo diante dos maiores desamparos,
insiste em brotar, em renascer,
em vencer, mesmo sangrando.
Que venha a nova mudança!
Que venha a esperança de avançar que sempre persiste,
apesar dos pesares dessa vida adulta tão cheia de contradições.
Percalços e poesia.

domingo, 28 de julho de 2013

O que muda e o que não muda

O que muda e o que não muda...

Eis um importante parâmetro para avaliar coisas da vida.

Há momentos felizes em que reencontramos quem mata nossa sede de falar, de ser escutada
por alguem que nos reconhece pelo olhar, pelo gesto,
pela delicadeza da troca. Precisamos tambem ouvir esse outro
e saber dele como tem sido a caminhada, como tem passado
pelas dores e alegrias da vida, quais as esperanças permanecem,
quais questionamentos brotaram, quais conquistas, quais desafios pela frente. A troca entre duas pessoas que torna aquele instante especial, tocando o transcendente.

Ha tambem momentos felizes em que estamos do lado daqueles que nos amam há tanto tempo,
que nos amam apesar de conhecer nossos defeitos desde que nascemos.
Às vezes não sentimos escutados nem olhados da forma como aquela criança
infantil que ainda vive em nos gostaria, mas chega o momento em que percebemos que
apenas o estar junto nos reabastece. Estar próximo, bater um papo,
compartilhar momentos, diante de novas mudanças que se aproximam.
Momentos em que uma escolha inesperada nos mostra que o poder de estar numa família
e mais forte que a diversidade de escolhas e modos de conduzir a vida. Momentos em que um elogio
sincero pode ter um valor inestimável.

Há momentos em que sentimos tanta alegria em compartilhar o fruto de nosso amor com aqueles
que nos cuidaram com tanto amor, que vibram com nossas conquistas e que nos dão suporte
quando precisamos. Que entendem nosso cansaço e se dispõem a se doar para que possamos realizar nossos encontros e trocas.

Há momentos que o deslumbre da perfeição se esvai e um conflito emerge lembrando que a vida também e isso. Momentos em que o assumir o erro pode ser tão significativo e saber perdoar pode ser uma dadiva. Momentos em que há disposição para ceder e dialogar, crescer no relacionamento e se doar.

Há momentos em que tudo o que queremos e voltar pra nossa casa, para nossa cama, para o lar que construímos com tanto amor, para os passeios na bela cidade em que vivemos. Há o momento de sair e o momento de voltar, momento de plantar, momento de esperar, momento de colher.

Há momentos em que toda uma família espera com alegria a chegada de um novo membro, já esperado antes mesmo de ser concebido. Há um casal que se prepara para acolher um novo ser com muito amor. Há um casal que se prepara para o casamento, há um amigo que espera ate o próximo encontro com o amigo.

Há momentos. Há laços significativos com os outros que persistem apesar das tantas mudanças cotidianos. Há uma sensação de gratidão que não tem como se expressar em gestos materiais. Há uma sensação de divino no encontro com o outro, na troca, no respeito ao diferente, no respeito à diversidade, no contato, no abraço, no olhar, no estar junto, no chorar junto, no sorrir junto. Há momentos em que vemos uma cidade do mundo receber tantos visitantes de vários lugares do mundo e se mantem bela, acolhedora, com suas riquezas e mazelas. Que a humilde vinda de um lider religioso possa inspirar aqueles que estão sem esperança. Que as diferenças possam ser acolhidas, que o respeito, a gentileza, a delicadeza, o perdão, possam permear as relações humanas. Se cada um de nos vai morrer um dia, que possamos cuidar um do outro.

Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu.
Há tempo de nascer, e tempo de morrer; tempo de plantar, e tempo de arrancar o que se plantou;
Tempo de matar, e tempo de curar; tempo de derrubar, e tempo de edificar;
Tempo de chorar, e tempo de rir; tempo de prantear, e tempo de dançar;
Tempo de espalhar pedras, e tempo de ajuntar pedras; tempo de abraçar, e tempo de afastar-se de abraçar;
Tempo de buscar, e tempo de perder; tempo de guardar, e tempo de lançar fora;
Tempo de rasgar, e tempo de coser; tempo de estar calado, e tempo de falar;
Tempo de amar, e tempo de odiar; tempo de guerra, e tempo de paz.

Eclesiastes 3:1-8

sábado, 13 de julho de 2013

Como lidar com a solidão?

Que vontade de ligar pra alguém... de mandar um e-mail, quem sabe...
Mas para quem? Não consigo pensar em ninguém nesse momento.
Como lidar com a solidão?
Como lidar com a dor, com o desamparo, com a angústia?
Será que é isso que aparece quando tememos a mudança?
E agora, como será? O que vem pela frente?
Qual será o desconhecido da vez?
Sempre estamos sós, mesmo acompanhados.
Sempre estamos só, mesmo quando realizamos o que sonhávamos.
No final das contas, só contamos com a gente mesmo.
E porque isso tem que doer ao invés de nos libertar?
Vivemos à procura de um outro
que nos conceda a chave do fim do sofrimento...
E nos esquecemos que nós somos nossos maiores causadores de sofrimento.
O dia chegará em que a solidão não será temida, rechaçada, disfarçada.
Mas acolhida, encarada, enfrentada.
A solidão é de cada um, é o que temos de mais nosso,
o que temos de mais humano,
é o que nos acompanha desde que nascemos
e que nos acompanhará até o retorno ao pó.
Que calemos nossas vozes interiores para escutar a voz do silêncio,
para um dia, quem sabe, aprender a lidar com a solidão.

terça-feira, 21 de maio de 2013

A ponte

"Como é que faz pra lavar a roupa?
Vai na fonte, vai na fonte
Como é que faz pra raiar o dia?
No horizonte, no horizonte
Este lugar é uma maravilha
Mas como é que faz pra sair da ilha?
Pela ponte, pela ponte


A ponte não é de concreto, não é de ferro
Não é de cimento
A ponte é até onde vai o meu pensamento
A ponte não é para ir nem pra voltar
A ponte é somente pra atravessar

Caminhar sobre as águas desse momento"

A ponte - Lenine

Como sair da ilha?
Como fazer ponte?
Como chegar aos outros em tempos de vida líquida?
Pela ponte, pela ponte...
Circular por novos lugares,
parar de olhar tanto para si e olhar ao redor,
resgatar a poesia perdida,
se doar para os outros,
dar ouvido àqueles que se aproximam e anseiam falar com alguém de sua dor,
suportar a dor do outro,
suportar a própria ao fazer uma laço signficativo com um outro,
ir em busca de novos desafios,
estar disposto a construir novas pontes
em novos lugares.
O perigo de assumir o desejo
é vê-lo se realizar...
Sair da lamentação e correr o risco de viver.
E construir pontes...

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Gonzaga de Pai para Filho



Um dos filmes mais intensos que já vi. Uma história não apenas sobre a vida de dois grandes gênios da música brasileira, mas sobre a intensidade das relações familiares, falando, no fundo, de todos nós.

Quem nunca questinou um familiar seu, seja pai, mãe, querendo saber de sua própria história, como aparece Gonzaguinha fazendo com o pai? Quem não teve seus embates com aqueles que mais ama na vida, seja pai, mãe, irmão, cônjuge? Quem não se viu diante de um momento em que pegou suas coisas e partiu para a vida, longe de seus familiares e em busca de si próprio?

É interessante acompanhar a história de Gonzaga, que ao chegar na cidade grande, começa por tocar músicas que acredita que os outros vão gostar, mas que não tem relação com suas origens. Contudo, só quando o rei do baião assumiu suas origens nordestinas que seu sucesso pode brotar.

Será que isso não acontece com cada um de nós? Muitos de nós podemos, ao ter partido, não querer saber de sua própria história, deixar de lado nossas raízes, querendo o novo com toda força de nossa alma, em busca de uma nova identidade.

Até que entendemos que precisamos nos libertar de nossa ânsia desenfreada por novidade, pois precisamos buscar em nós mesmos, em nossas próprias raízes a fonte daquilo que queremos pra nossa vida. Afinal, como diz Lacan, o desejo é desejo do outro. Só podemos desejar porque alguém ou alguéns, algum dia, sonhou com nossa existência.

E retomar aquilo que nos constitui não significa alienação, pois para que possamos nos separar de algo precisamos primeiro ver o quanto aquilo faz parte do que somos. Assumir nossas raízes, nossa história, nos apropriar do que é nosso para sermos autênticos na vida e não meros reprodutores do ambiente ao redor. Como comenta Freud citando Goethe:

"Aquilo que herdaste, torna-te teu para que possas merecê-lo."

Os sofrimentos que pai e filho passam, sejam na história individual de cada um, seja na relação conflituosa entre pai e filho, nos fazem lembrar o quanto cada um passa por tragédias: perdas, dificuldades, impasses, dores. Mas mesmo diante dos pesares da vida, é possível seguir em frente, buscar diálogo, superar mágoas, ter humildade de perdoar, de ter tolerância com o outro. E não perder a poesia da vida.

Amadurecer é perceber que não somos nada, que orgulho não leva a nada, que precisamos do laço com o outro para buscar nossos sentidos próprios. Cada um dá o que consegue dar, e nossa abertura e aceitação da vulnerabilidade do outro pode nos permitir abrir portas no coração do outro que estavam fechadas. Afinal, "Somos nós que fazemos a vida
Como der, ou puder, ou quiser...
". Abaixo, a belíssima música de um filho que buscou um pai e o encontrou:

O QUE É O QUE É
(Gonzaguinha)

Eu fico
Com a pureza
Da resposta das crianças
É a vida, é bonita
E é bonita...

Viver!
E não ter a vergonha
De ser feliz
Cantar e cantar e cantar
A beleza de ser
Um eterno aprendiz...

Ah meu Deus!
Eu sei, eu sei
Que a vida devia ser
Bem melhor e será
Mas isso não impede
Que eu repita
É bonita, é bonita
E é bonita...

E a vida!
E a vida o que é?
Diga lá, meu irmão
Ela é a batida
De um coração
Ela é uma doce ilusão
Hê! Hô!...

E a vida
Ela é maravilha
Ou é sofrimento?
Ela é alegria
Ou lamento?
O que é? O que é?
Meu irmão...

Há quem fale
Que a vida da gente
É um nada no mundo
É uma gota, é um tempo
Que nem dá um segundo...

Há quem fale
Que é um divino
Mistério profundo
É o sopro do criador
Numa atitude repleta de amor...

Você diz que é luta e prazer
Ele diz que a vida é viver
Ela diz que melhor é morrer
Pois amada não é
E o verbo é sofrer...

Eu só sei que confio na moça
E na moça eu ponho a força da fé
Somos nós que fazemos a vida
Como der, ou puder, ou quiser...

Sempre desejada
Por mais que esteja errada
Ninguém quer a morte
Só saúde e sorte...

E a pergunta roda
E a cabeça agita
Eu fico com a pureza
Da resposta das crianças
É a vida, é bonita
E é bonita...




quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

A mudança do segundo ano de um filho




O segundo ano de um novo ser que cada vez mais tem energia... E quanta energia!

No começo, os prazeres da festinha de um ano, preparativos, a festinha em si, a primeira vela soprada,
reunião de pessoas queridas,
alegrias que ficarão pra sempre guardadas no coração e lembradas com doçura nas fotografias.

Depois, a retomada das atividades, a mãe passa a olhar com mais vontade para outros interesses e atividades, afinal,
a delicadeza do primeiro ano de seu filho passou. Há mais tranquilidade na separação mãe e filho, a amamentação cessa como um processo natural na relação entre ambos. A mãe fica com menos neura, afinal, seu filho agora tem mais de um ano. O pai se empolga pois agora pode fazer brincadeiras mais movimentadas que os filhos curtem demais!

Hora de acompanhar os primeiros passos, as primeiras palavras, os primeiros tombos, as idas aos parquinhos, os abraços e carícias espontâneas que o filho dirige aos pais. A mudança de ter um filho que caminha, que cada vez mais se dirige à conquista de sua autonomia, ao mesmo tempo em que cada vez mais consegue expressar sua necessidade de aconchego, proximidade e de atenção intercalada com suas conquistas em direção do mundo.

É incrível como o desenvolvimento motor vai acelerando, um bebê que há poucos meses mal engatinhava, de repente já está até correndo... O caminhar vira uma diversão, andar certas distâncias, subir e descer morro, correr livre pela praça numa alegria sem tamanho, se dirigir com coragem para pista de dança e dançar encantando a todos, a espontaneidade do movimento da dança que cativa. Como aprender com a criança o encantamento com coisas tão simples? Coisas simples a nossos olhos viram fonte de grandes aventuras para nossos pequeninos andantes. Os brinquedos mais interessantes não são aqueles mais caros, mas coisas simples como pedrinhas, vasinhos vazios de flores.

Hora de sentir saudade de bebezinho, pois agora o que temos é um bebezão rumo à criança, saindo da dependência no rumo da independência (tarefa que vamos exercer por toda a vida). Já? Como passou rápido. Hora de retormar nossas questões existenciais, rever planos, projetos e sonhos, e quem sabe até sonhar com outro bebezinho mais pra frente?

Com o crescimento de nossos pequenos, também emergem novas sensações para nós pais, outros tipos de cansaços, diferentes dos anteriores. O desejo de compartilhar com outros pais os desafios das novas fases que passam nossos filhos, a necessidade de se adaptar a novas rotinas que emergem, de tirar forças (às vezes não sabemos de onde) para estar do lado deles e fornecer nosso cuidado amoroso, mesmo diante das dificuldades do cotidiano da vida adulta. Afinal, nós que somos adultos que nos viremos para dar conta da grande responsabilidade que é cuidar de um filho e educá-lo para vida. Nós fizemos a escolha de ser pais e temos um compromisso com a vida de nossa herança pro mundo.

Como li no blog Mamãe no divã: "Temos de aproveitar cada segundinho deles pequenininhos. Seremos pais por toda vida e eles crianças só uma vez." Que saibamos aproveitar os segundinhos com nossos pequenos, que expressemos nosso amor que deixará marcas para sempre na pessoa que nosso filho irá se tornar. Já percebemos que mesmo num dia exaustivo que tenhamos, um sorriso de nosso filho dirigido a nós nos lembram de que todo o cansaço, a responsabilidade, a imensa aventura e constante mudança que é ser pai, ser mãe, vale a pena. "Nada é sem custo, nada é barato. Mas este é o valor das coisas, por sua conquista."


quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Saudade

Amanhã é primeiro de fevereiro...
E q saudade é essa que eu sinto no peito?
Uma saudade do que ainda não vivi, do perfume que ainda não senti,
do filho que ainda não tive, do amigo que ainda não fiz, do emprego que ainda não consegui.
Uma saudade do futuro...
uma saudade da serenidade que ainda não tenho,
da sabedoria que ainda não alcancei,
da paz que ainda não encontrei.
Hoje me sinto diferente pois choro por tentar parar com as saudades que ainda sinto do passado.
Saudades que apertam o peito e dão aquele nó na garganta...
Coisas que ainda guardo em mim mas que preciso urgentemente dizer adeus e vê-las indo embora,
uma a uma, no córrego da vida.
Preciso abrir espaço,
preciso de leveza,
preciso de mudanças,
preciso mudar de saudade.
Saudar o presente, sem ter tanta saudade do futuro também,
valorizar o que tenho agora, as conquistas e dores que carrego em mim
e que me fazem quem sou neste instante efêmero.

Pensando bem, não dá pra deixar ir embora no córrego da vida as coisas, lugares e pessoas que amei. Algumas eu deixxo partir, outras eu guardo comigo, singelos sorrisos, doces frases, trocas profundas, paisagens lindas...

Acho que tô com mais saudade do passado agora! O passado não passou, ele está em mim, ele pulsa em mim, que eu traga dele apenas a leveza do que teve o seu tempo de ser vivido, que eu aprenda a lidar com o fim, com a mudança, e que eu possa acolher as saudades de ontem, de hoje, e de sempre.

"dessa saudade que eu sinto
de tudo que eu ainda não vi"

sábado, 5 de janeiro de 2013

A mudança do início

Para começar o ano, pego emprestado palavras de duas mulheres apaixonantes: Viviane Mosé e Martha Medeiros. Já que a verdade é não-toda, que a arte nos permita brincar com ela.

LÚCIFER E OS LÚCIDOS

(Martha Medeiros)

"Lúcido deve ser parente de Lúcifer
A faculdade de ver deve ser coisa do demônio

Lucidez custa os olhos da cara
"

Estou embriagada pelos novos poemas de Viviane Mosé. Esta é só uma palhinha de Pensamento Chão, um livro essencial nesses tempos em que já sabemos que não convém circular de Rolex por aí, já sabemos que certos políticos nunca ouviram falar em honra, já sabemos que o verão vai ser sufocante e só nos resta olhar um pouco para dentro de nós, único lugar onde ainda encontramos alguma novidade.

Essa visão inusitada que Viviane nos oferece sobre lucidez, por exemplo, é um convite para a reflexão. Em tempos insanos, de tanta gente maluca por vaidade, maluca por juventude, maluca por dinheiro, maluca por poder, os lúcidos destacam-se pela raridade. São aqueles que não inventam personagens de si mesmos, não se trapaceiam, não criam fantasias, ao contrário: se comprometem com a verdade. E se envolver assim com a transparência dos fatos requer uma integridade diabólica. Para olhar o bicho nos olhos é preciso ser bicho também. Enfrentar a verdade é quase um ato de selvageria.

Mas que verdade é essa, afinal? É aí que o demônio apresenta sua conta, pois o lúcido tem que se confrontar com uma verdade desestabilizadora: a de que não existe verdade absoluta. Nossos pensamentos não estacionam, nossos desejos variam, o certo e o errado flertam um com o outro, não há permanência, tudo é ilusório, e buscar um porto seguro é antecipar o fim: a única segurança está na morte, será ela nosso único endereço definitivo. Durante o percurso da vida, tudo é movimento, surpresa e sorte.

O lúcido faz parte do time - cada vez mais desfalcado - dos que se desesperam como todo mundo, porém de um modo mais íntimo e refinado. O lúcido organiza sua loucura, acondiciona o que está solto no ar, interliga várias idéias independentes para que, agarradas umas nas outras, não se dispersem, estejam ao alcance da mente. Quanto mais o lúcido pensa, mais percebe que lucidez plena não existe, o que existe são suposições, algumas até coerentes, e que nos mantêm no eixo. Lúcido é aquele que sabe que lucidez é uma falácia, e não pira com isso. Recebe a conta das mãos do demônio, calcula os ganhos e os prejuízos, e paga. Custa sim, Viviane, os olhos da cara, pensar, pensar, pensar e repensar, pensar e compensar, pensar, pensar, pensar e morrer do mesmo jeito. Por isso achei tão interessante seu poema. Você matou a charada: Lúcifer é uma espécie de padroeiro dos lúcidos - e lúcido é só um outro nome para louco. O louco que tem a cabeça no lugar demais.

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Versos de Viviane Mosé

"Pessoas pedem o que não tem noção do que seja"

"Cada um só sabe mesmo as coisas que suporta saber
Não sabe outras"

"Dizem que a vida e a palavra andam transando
(parece que é uma questão de língua)"



"Acho que o ofício de ser gente me excessiva.
Pessoas são pessoas o tempo todo demais.
Ser gente me excessiva.
Gente me excessiva.
E me falta"


"Afirmar a vida é afirmar o corpo.
Afirmar o tempo no corpo.
O tempo do corpo. O chão.
Afirmar a vida é afirmar a morte."


Dos livros:
Medeiros, Martha. Doidas e santas. Porto Alegre, RS, 2012.
Mosé, Viviane. Pensamento chão. Rio de Janeiro, Record, 2007.