terça-feira, 12 de outubro de 2010

Pré-história de um novo ser

Fiquei pensando no porquê de não estar falando muito de minha gravidez nesse blog. Nunca tive a intenção de me expor muito, sobretudo expor uma criança que ainda nem chegou ao mundo. Resolvi escrever esse blog com a idéia inicial de pensar sobre idéias que possibilitem uma reflexão sobre a existência humana, mas tenho visto que é inevitável expor um pouco de mim. E esse momento tão sagrado e especial que é a maternidade, a história e pré-história de um ser que virá ao mundo, não pode ficar de fora dessas reflexões.

Quando será que podemos dizer que nasce a história de um filho? Será que teria um ponto de origem?

Uma coisa vejo como certa: esse ponto inicial não seria apenas a fecundação, o momento em que o espermatozóide e o óvulo se encontram. Há toda uma pré-história, e como o nome mesmo já diz, anterior a esse momento, que influenciará esse novo ser que está sendo gestado. E de repente, podemos deixar de lado o termo pré-história e usar o “história”.

Será que a história de um ser nasce no momento em que o casal se encontra e faísca aquela chama inicial que um dia se tornará um amor solidificado? Será que essa história nasce a partir do momento em que os pais ainda são crianças e começam a serem “humanizados” a partir do relacionamento que estabelecem os próprios pais?

Outra hipótese: que essa história do novo ser se encontra dentro de uma história bem maior, das duas famílias dos membros do casal, que tiveram suas vivências, alegres e sofridas, ao longo de muitas e muitas gerações? De uma história mais ampla ainda, da cultura, religião, das tradições, do país (ou países) de origem de familiares dessas famílias?

Nessa época de intenso individualismo propalado pela cultura, não podemos deixar de transmitir para as novas gerações nossa “dívida com o simbólico”, ou seja, não viemos do nada, mas temos toda uma constelação familiar (no caso duas que se uniram no casal parental), e, mais amplo que isso, uma cultura e sociedade que influenciam no modo como sonhamos, desejamos e como educaremos esse novo ser. Assim como os cortes, as rupturas, as mudanças que efetuemos quanto a nossas famílias.

Portanto, a história de uma criança também está ligada a forma como cada pai lida com sua família, como o casal se conheceu e construiu esse amor, como essa nova família foi se construindo, que desafios teve que enfrentar e que dificuldades superar. Como foi o planejamento ou não desse fruto do amor do casal, como reagiram desde a notícia do teste positivo da gravidez.

Também é importante como tem sido a gestação, o que a mãe tem sonhado, imaginado, sentido. Como o companheiro a tem apoiado – fator esse muito importante para o processo da gravidez. Muito se fala da mulher, se associa a gestação com o feminino, e é óbvio que é a mulher que está tendo toda uma transformação em seu corpo e suas emoções, mudanças essas que o homem não sente na pele. Até o nome dos cursos para os novos papais parece restringir essa responsabilidade que deve ser compartilhada desde o início: “Curso para gestante”; porque não “Curso para família grávida, para pais?”.

A felicidade do pai desde o momento que sabe da notícia da gravidez pode fazer com que a gestante desde o início sinta esse apoio que será essencial durante todo o período da gravidez e após o nascimento, e podemos dizer até durante todo o desenvolvimento da criança e de sua vida. Poder oferecer uma referência masculina, paterna à criança é fundamental em seu crescimento e amadurecimento. E é do desejo de dois que um novo ser pode nascer, algumas psicanalista que estudam bebês dizem que, na verdade, é do desejo de três que o bebê pode nascer: desejo do pai, da mãe e do próprio bebê, que já é um sujeito de desejo.

Assusta-me esse pensamento contemporâneo de que a mulher pode realizar uma “produção independente”, como se gerar um novo ser fosse produto de um mero capricho individualista, ao invés de considerar a criação de uma nova vida como capaz de ser nomeada como pertencendo a toda uma pré-história de dois seres que se uniram, se amaram e estão à espera de consolidar uma nova família. Claro que há outras situações em que há uma gestação, mas no geral creio que acontece isso que mencionei anteriormente.

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