domingo, 10 de junho de 2012

Perder e Criar

Às vezes nos sentimos tão cansados...
Mais uma vez, dar adeus a uma pessoa querida...
Mais uma vez, começar algo novo, que demanda energia e investimento...
Mais uma vez, uma frustração que angustia, a qual ainda não nos acostumamos...
Mais uma vez, uma tentativa fracassada de mudar um mau hábito...
Mais uma vez, a busca de enfrentar as tristezas que nos habitam para tentar mudar repetições automáticas...
Uff! Como nos exige o fato de estarmos vivos!


Outro dia conversava com uma amiga sobre a dificuldade da gente aceitar a perda.
E não tem jeito, temos que assumir: acabou, chega com esse apego, já está na hora de aceitar que mudou, é urgente abrir espaço para o novo.

E toda mudança implica em alguma cota de perda.
Perder a proximidade de pessoas queridas, perder o conforto da pausa de buscar o conhecimento que nos inquieta,
perder o familiar conforto do mau hábito, perder coisas que já perdemos há muito tempo mas insistimos em manter.

Uma grande dificuldade do ser humano é lidar com as perdas, com as frustrações, lidar com isso que é o acaso, o imprevisível, o incontrolável da vida. Aceitar que não estamos no controle da nossa própria vida, que há algo que nos foge ao controle, que nos escapa, que nos surpreende.

Talvez sejamos muito narcisitas e não aceitamos a ferida de ter que deixar coisas pra trás, coisas preciosas que nos diziam quem éramos, que faziam parte de nossa identidade, de quem somos ou de quem fomos.

Aceitar que não somos mais aquela pessoa daquela época, que não precisamos mais daquilo, que não vamos morrer (pelo menos por enquanto) pelo fato de perder e de nos depararmos com nossa vulnerabilidade, com nossa finitude, e da constatação, no fim das contas, de que cada um nasce só e sozinho dá o último suspiro.

As coisas, as pessoas, as situações pelas quais passamos, tudo é passageiro em nossa existência. Uns chegam, outros partem. E é nesse espaço que fica que podemos criar, é esse vazio que nos move, é essa falta que dói que constitui o sujeito que somos. Vazio, falta, perda, sujeito. Já dizia Lacan que "É da separação que surge o sujeito. É da separação que surge a vida."

O que seria de nós se não tivéssemos nos separado de outros momentos de nossa vida? O que seria se não houvesse tido separação do ventre materno no parto? A separação do desmame? A autonomia de começar a andar? De começar a falar? De ir pra escola? De sair da escola? De ir pra faculdade? De sair da faculdade? De mudar de cidades? De começar um grande amor? De começar a vida profissional? De mudar de empregos? De ter um filho?

A vida é feita de diferentes fases. Uma nova fase começa, nos angustiamos, mas acabamos por adaptar, e quando já estamos adaptados... uma nova fase vem, e começa tudo de novo, nos inunda um novo que é novo, é mudança, é dor, é perda, e também é vida.

E entre um ponto e outro, entre o nascer e o morrer, podemos saborear pequenas alegrias, reabastecer nossos corações, aliviar o cansaço, voltar a enxergar as pilulas de felicidades diárias e conseguir mais força pra caminhada. Reencontrar pessoas queridas, compartilhar comemorações e risadas, presenciar a confraternização por importantes decisões na vida de pessoas que nos são importantes - que comemoram o início da preparação para uma especial mudança. Conhecer novos lugares, retomar a alegria de se entregar ao mergulho no mar, vivenciar novas experiências. Construir novos laços, preparar-se para novos desafios que virão.

Que a gente possa aprendar a ser humilde para não se incomodar tanto com a perda. A valorizar as dádivas que recebemos ao longo da vida e que muitas vezes esquecemos quando olhamos somente pra perda. A ser forte para assumir que algo chegou ao fim. A ser criativo para preencher com o novo o espaço que fica - e não lamentar pelo que se foi e deixar o espaço mais vazio ainda. A reviver a alegria inocente da criança que se maravilha diante da descoberta do contato com o mar, que leva e traz as ondas, assim como a vida nos leva e nos traz as coisas, e o que nos trouxe, um dia também nos levará.

E que a perda não seja apenas chorada, mas também comemorada, pois pra viver precisamos perder, e só ao perder, podemos conquistar novas possibilidades, podemos, enfim, viver.

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